Espetáculo

A Mancha

De Lúcia Pires

"Uma metáfora da nossa relação com o mundo e com nós próprios nesse mundo. O mundo é caos, é incerteza, é insegurança, é dor, é tristeza. Não é previsível nem confortável.

Nós aprendemos a viver com ele, e a astúcia da humanidade encontra na tecnologia uma forma de se proteger contra ele. Mas a que preço?

Quanto menos humanos formos, maior será o nosso conforto. E assim, na troca dos nossos membros, órgãos e alma, viveremos na ordem, na certeza, na segurança, no conforto apático de uma existência indolor, sem memória e lentamente sem mais nada que nos torne indivíduos humanos.

Três personagens. Uma família de um universo distópico: homem, mulher, filho, fazem parte de um só corpo, uma árvore. A narrativa descreve a relação desta família, a posição extrema de Torpor, que defende com tudo o que tem que o mundo é uma Mancha e se deve manter afastado dele, tal como da dor que ele provoca.

Senhorinha, que se revela na mesma posição, porém com indícios que desterram incerteza na sua relação com o mundo, nomeadamente quando se percebe o quanto ela quer voltar a ver a sua mão, há muito separada do seu pulso. E a inocente Impureza, que promove uma curiosidade pura e justificada, ou impura aos olhos dos seus “pais”, mantendo ainda a forma humana mais completa, mais racional e individual.


A Mancha é uma história sobre família, humanidade, filosofia. O nosso objectivo é que o espectador tenha uma reflexão sobre a sua vida, de forma elegante e serena, sem julgamento ou sentimento de culpa evidenciando que, apesar de toda a angústia que o mundo nos possa trazer, teremos de consagrar com gratidão a possibilidade de estarmos vivos e a possibilidade de expressar empatia pelos nossos próximos.

David Personne

Texto escrito no âmbito do Laboratório de Escrita para Teatro 2018/19 do Teatro Nacional D. Maria II.